domingo, 29 de agosto de 2010

conto em homenagem...

Levava uma vida pacata. Ou assim pensava. Olhando para trás não via muitas conquistas ou aventuras. Amores teve, e muitas decepções também. Passou a acreditar que seria impossível encontrar alguém com quem pudesse ser feliz e natural. Não culpava ninguém além de si mesma por isso, mas, por mais que pensasse e se esforçasse pra encontrar uma maneira de mudar, não conseguia. Portanto aceitou sua vida pacata, aceitou sua solidão, aceitou suas lágrimas, até que estas secassem. E quando, por fim, secaram, enxeu-se o peito de vazio de uma tal forma que mal conseguia sentir o bater de seu coração. Esse silêncio abriu uma fenda em sua mente. Passou então a acreditar que perdera a lucidez. E assim foi, passo a passo, andando de cabeça baixa, sem saber por onde sua loucura lhe guiava. A noite tinha muitos sonhos, e ao acordar sentia faltar o ar, como se a realidade não fosse suficiente pra sobreviver. Tentava fechar os olhos e adormecer, mas seu corpo exigia que se levantesse, porque o desejo peculiar à matéria sempre dominou a liberdade de sonhar. Tinha pai, tinha irmãos, tinha amigos, mas não tinha no peito familiaridade de estar em casa. Aceitou também o vazio de não pertencer a nada. E aceitando isso e aquilo encontrou-se impossibilitada de enxergar outra vida pra si mesma. Amava muito as pessoas, porque era o único sentimento que lhe restara. E sendo este o sentimento fundamental da vida conseguiu sobreviver. Cega, muda e surda. Porque assim acreditava. Amava porque era a única maneira de se aproximar de alguma coisa, qualquer que fosse, mas que ela pudesse afirmar ser real. Amou e amou e amou. Mas nunca enxergou o resultado de seu amor. Até o dia em que caiu-lhe pela face em chamas a primeira de muitas lágrimas. O motivo foi uma pequena palavra direcionada a ela. Uma característica apontada por uma amiga. Uma amiga das mais amadas, mas como todos, invisível. Chamou-lhe de mãe. Voltou a ver. Voltou a ouvir. Voltou a falar. Voltou o olhar para a amada. E chorou as lágrimas de toda uma vida. Amou e amou e amou! Acordou de seu sonho-pesadelo e aceitou uma última coisa: a liberdade.

Um comentário:

Bia Raphael disse...

Ju, Ju, linda! Me deixou com os olhos brilhantes!